Mikaelli Andrade

Mikaelli Andrade
Cachoeira Brejão/Coribe-Ba
”A água é o sangue da terra. Insubstituível. Nada é mais suave e ,no entanto , nada a ela resiste. Aquele que conhece seus princípios pode agir corretamente, Tomando-a como chave e exemplo. Quando a água é pura, o coração do povo é forte. Quando a água é suficiente,o coração do povo é tranquilo.” Filósofo Chinês no século 4 A.C

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"As preocupações ambientais contemporâneas originaram-se da percepção da pressão sobre os recursos naturais causadas pelo crescimento populacional e pela disseminação do modelo da sociedade de consumo"

domingo, 18 de julho de 2010

Nacentes e Vertentes




"A concepção predadora do desenvolvimento brasileiro literalmente tem matado nossas nascentes e vertentes"

Se conversamos com qualquer pessoa mais velha, ela vai dizer: “ali tinha uma nascente, hoje não tem mais; ali corria um riacho, hoje não tem mais”. Com a destruição da cobertura vegetal, na maior parte das vezes em função da agricultura, as nascentes desaparecem. Hoje há programas de proteção e recuperação de nascentes, que desapareceram.
Esse é o problema mais grave. Não basta existir água na face da Terra. Ela não desaparece, não diminui sua quantidade em termos globais. O ciclo das chuvas repõe essa água. Entretanto ela pode ir ficando cada vez mais distante, cada vez mais contaminada, cada vez mais inacessível. A morte das nascentes é a prova dessa realidade.

Há também nessa linha uma nova consciência. Mas há conflito. A concepção predadora do desenvolvimento brasileiro literalmente tem matado nossas nascentes e vertentes.
A agricultura irrigada consome em média 70% da água doce do planeta. No Oeste Baiano, onde o agronegócio avançou sobre o Cerrado, os pivôs centrais de irrigação funcionam a céu aberto, mas sem outorga para explorar o aquífero Urucúia, o maior manancial de abastecimento do Rio São Francisco.

O agronegócio não só consome muita água, como devasta a cobertura vegetal das bacias. A falta de vegetação tem um enorme impacto na erosão dos solos e na penetração da água no subsolo. Se há vegetação, cerca de 60% da água da chuva penetra no chão, formando os aquíferos. Se não há cobertura, a água escorre, erodindo os solos e não penetrando no solo. Nessas condições, só 20% penetram no chão. Por isso que muitos rios, quando precisam de seus mananciais subterrâneos para sobreviver, mostram toda sua fraqueza, baixando terrivelmente o nível de suas águas.

O agronegócio é o grande responsável não só pelo desmatamento brasileiro, mas também pela mudança no regime de nossos rios, juntamente com as grandes barragens.

A realidade do saneamento ambiental no Brasil continua precária. Cerca de 50% de nossos lares continuam sem coleta de esgoto. No Norte e no Nordeste esses números crescem assustadoramente. Agora, com o PAC, está previsto um investimento de 170 bilhões de reais para saneamento. Vamos ver se prosseguiremos consistentemente nessa linha.

O Brasil ainda está implantando o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos, criado pela lei brasileira 9.433/97. O sistema está baseado nos Comitês de Bacias Hidrográficas, tendo como cúpula o Conselho Nacional de Recursos Hídricos. Ele prevê a cobrança da água e a necessidade da outorga para qualquer usuário impactante. É difícil dizer como está essa montagem em cada bacia. No Rio São Francisco, o comitê está montado, tem seus limites, mas tem sido importante no debate sobre a transposição. Demarcou sua posição, contrariou o governo, que levou a decisão para o Conselho Nacional. Ali o comitê foi derrotado, já que no Conselho a grande maioria é representante de órgãos governamentais.

Um dos argumentos dos defensores do novo sistema é que a cobrança pela água vai obrigar as empresas a usá-la mais racionalmente. Vai custar mais. Pode ser que dê certo.

Na agricultura, hoje, se fala muito em novas técnicas, poupadoras de água, abandonando técnicas predadoras como os tais pivôs centrais. No Nordeste, dizem os especialistas, cerca de 80% da água se perdem antes de chegar ao chão. Como é muito quente, a água evapora antes de cair. As práticas estão indicando outras tecnologias, como o gotejamento na raiz da planta.

Porém a mudança tem que ser mais profunda, mais que a mudança de técnicas. A agricultura está consumindo 70% em média da água doce mundial e essa quantidade tem se mostrado insustentável. É a grande causadora da crise global da água. Nesse padrão de consumo, não há técnica que resolva.

Nossos desafios, nossas ações

Diante dessa realidade toda, a gente se pergunta sobre o que é possível fazer. Eu penso que sempre devemos partir dos próprios hábitos cotidianos, individuais e familiares, até chegar às lutas políticas mais amplas, sejam nacionais ou internacionais. Nem todos têm essa possibilidade. Mas podem compreender e ajudar desde o nível local.

Uma boa medida é calcular quanto de água se gasta em casa por pessoa ao mês. É só pegar a conta da água, dividir a metragem pelo número de pessoas e depois dividir pelos dias do mês. Se o consumo diário de cada pessoa estiver acima de 120 litros por dia, já há desperdício. Precisamos relembrar que o maior problema não está no consumo humano, mas na agricultura irrigada. Entretanto essa água usada em casa é tratada, custa caro, faz falta aos que moram nas periferias ou em comunidades distantes, onde a água é de acesso mais difícil.

O envolvimento mais profundo de cada um com essa causa depende da decisão das pessoas. E na defesa de nossos rios, riachos, igarapés, mais uma vez há quem tenha mais responsabilidade. Um desafio está entre municípios que ocupam a mesma bacia, seja a montante, seja a jusante. Os municípios que estão acima têm que se perguntar que água deixam para os que estão abaixo. É necessário mesmo um manejo articulado no uso dessas águas. A responsabilidade aqui é das autoridades. Mas, no Brasil, autoridades só costumam trabalhar, funcionar, se tiver pressão. Então, mais uma vez entra o papel dos cidadãos, organizados em movimento, ONGs etc., para pôr essa pauta para as autoridades. Vale lembrar aquele poema de Fernando Pessoa que, em outras palavras, dizia: “O rio mais importante de minha vida é o rio de minha aldeia”.

A escola pode desempenhar um papel diferente e diferenciado nesta luta. Ela é essencial. Nossa geração já veio com defeito de fabricação. Fomos mal educados no trato com a água e o meio ambiente. Portanto ficou mais difícil de nos responsabilizarmos. As novas gerações têm mais facilidade, até porque serão as grandes vítimas da tragédia ambiental que deixaremos para elas.




Mundo Jovem

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