Mikaelli Andrade

Mikaelli Andrade
Cachoeira Brejão/Coribe-Ba
”A água é o sangue da terra. Insubstituível. Nada é mais suave e ,no entanto , nada a ela resiste. Aquele que conhece seus princípios pode agir corretamente, Tomando-a como chave e exemplo. Quando a água é pura, o coração do povo é forte. Quando a água é suficiente,o coração do povo é tranquilo.” Filósofo Chinês no século 4 A.C

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"As preocupações ambientais contemporâneas originaram-se da percepção da pressão sobre os recursos naturais causadas pelo crescimento populacional e pela disseminação do modelo da sociedade de consumo"

terça-feira, 17 de agosto de 2010

É preciso ouvir o Brasil, de fato

Quantas reportagens precisam ser publicadas para se construir uma verdade? Nos últimos meses, o tema agrotóxicos se tornou “campeão” de matérias. O problema é que, em sua absoluta maioria, prevalecem informações incompletas, quando não equivocadas, que geram opiniões pouco consistentes. Outro aspecto é que tais coberturas atingem a imagem do Brasil como um dos principais produtores de alimentos do mundo. Ou seja, prejudicam, principalmente, os agricultores. Cabe, portanto, questionar: com quais interesses?Pela falta de conhecimentos mínimos sobre a agronomia das plantações, tais matérias são facilmente desqualificadas à luz da ciência. Se não, vejamos.
Mercado mundial de defensivos agrícolas
Por exemplo, a reportagem “A alimentação dos brasileiros está cada vez mais envenenada”, assinada por Pedro Carraro, na revista Brasil de Fato, cita que o país produz 700 milhões de toneladas de agrotóxicos. Erro gritante: o jornalista escreveu, para mais, em mil vezes! Em 2009, os agricultores utilizaram no combate às pragas 673 mil (e não milhões) toneladas de defensivos agrícolas.
Alardeiam-se este volume colocar o Brasil como o maior mercado desses insumos do mundo. A agropecuária brasileira, que em resumo significa produzir alimentos e biocombustíveis, responde por 23,7% do PIB nacional; movimenta 38,5% da exportações e emprega cerca de 40 milhões de pessoas. Motor da economia, lidera o ranking da produção mundial de 10 tipos de alimentos e está entre os maiores produtores em cerca de trinta produtos.
Não há porque estranhar, portanto, o fato de o Brasil estar entre os que mais adotam a ferramenta tecnológica de proteção de suas lavouras para produzir comida. Ou então, seria o caso de se questionar o país, por exemplo, estar entre os maiores mercados do mundo em computadores, automóveis e celulares.
Proteção do alimento nas lavouras
Estudos da FAO, Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação, demonstram que esta tecnologia de controle de pragas evita a redução, em média, de 38% na produção dos alimentos. Nos países sob clima tropical, há ampla proliferação das pragas nas lavouras, o que exige muito maior uso da tecnologia do que em países temperados e frios. Portanto, os defensivos têm importância estratégica para a agricultura brasileira e da própria sustentabilidade do país. Seriam dramáticas as conseqüências do descontrole no combate às pragas em hortaliças, frutas e cereais – como arroz, milho, trigo e feijão – apenas para citar alguns itens imprescindíveis na cesta básica da população.
Contudo, há outro Mas, Apesar da maior exigência por defesa vegetal na agricultura dos trópicos,
Uma leitura ainda mais detalhada dos números, e sem pueris distorções ideológicas, levará à conclusão exata do panorama mundial deste mercado. Trata-se do fato de que – embora a agricultura sob clima tropical exigir muito maior uso da tecnologia para controlar as pragas – o Brasil, hoje, ainda não estar entre aqueles que mais utilizam defensivos agrícolas. Se não, vejamos.
→ Entre os grandes países agrícolas, o Brasil apresenta um dos menores investimentos por tonelada produzida e por área plantada.
→ Nos dados globais disponíveis em 2007, segundo a Consultoria Amis, o consumo por unidade de área no Brasil foi de US$ 88/ha, e por produção, US$ 7,4/t. No Japão foi de US$ 851/ha e US$ 73/t, respectivamente; na França, US$ 197/ha e US$ 22/t.
→ Em 2007, o aumento no Brasil foi de apenas 1%, muito inferior ao de países como Argentina, que aumentou em 49%; China, 25%; e França, 28%; houve queda apenas no Japão e nos EUA, país que cultiva em larga escala variedades transgênicas – cerca de 90% em soja e milho –, que exigem menor manejo com defensivos agrícolas.
Há ainda outro ledo engano da revista ao tentar caracterizar o mercado brasileiro com o uso defensivos. Para tanto, recorre a dados de um estudo segundo o qual a área agrícola no país, entre 2004 e 2008, reduziu 2,5%, enquanto as vendas do produtos aumentaram 31%. Ora, as contas corretas a ser feita são outras: em primeiro lugar, a redução de área plantada em tempos de recursos naturais escassos deve ser saudada com uma ótima notícia, e não a crítica; segundo, ainda mais importante: se o repórter levantasse, juntamente, os números da safra de grãos colhida no período, veria que a o maior uso de insumos com tecnologia trouxeram competitividade fantástica à agricultura do país. É o que explicam estudiosos da USP:
“A adoção de tecnologias de base genética (sementes e mudas) e química (fertilizantes e defensivos) está associada ao crescimento da produção de grãos, que nos últimos 20 anos aumentou em mais de 100% resultante do incremento da produtividade”. (Relatório “Organização dos mercados de insumos e suas relações com a agricultura”; Centro de Conhecimento em Agronegócios, PENSA, da FEA/USP).
Conclusão a que se chega: a diferença entre o investimento em custeio da safra e o resultado colhido, impulsionado pela produtividade, é o ganho final do agricultor.
Mercado amplo e concorrido
Outro equívoco elementar na reportagem do Brasil de Fato é repetir, sem o menor pudor, um discurso que lembra o tom das lideranças do MST contra o “monopólio”.
Com um rápido de trabalho de apuração, o repórter constataria que o mercado de defensivos agrícolas no Brasil é, possivelmente, o mais diversificado do planeta. Afinal, ele soma mais de 100 empresas dedicadas à pesquisa, produção e comercialização de agroquímicos. Estas empresas são representadas por quatro entidades reconhecidas em âmbito nacional.
O SINDAG, Sindicato Nacional da Indústria de Defesa Vegetal, reúne 44 associadas, entre as quais as 15 filiadas à ANDEF, Associação Nacional de Defesa Vegetal, que pesquisam e desenvolvem novos ingredientes ativos. A ABIFINA, Associação Brasileira das Indústrias de Química Fina, Biotecnologia e suas Especialidades, conta com 41 associadas, entre as quais a maior parte é fabricante de produtos agroquímicos. A AENDA, Associação das Empresas Nacionais de Defensivos Agrícolas, congrega 47 empresas afiliadas.
A concorrência acirrada entre as empresas traz outra característica benéfica aos agricultores: ampla gama de oferta de produtos com maior eficiência na produção, acompanhadas da redução dos custos. Isto ainda se reflete nos menores preços pagos pelos consumidores dos alimentos nas cidades. É o que atestam os dados históricos, nos últimos anos, sobre preços e a queda do IGPM, traduzindo-se em menor inflação.
De acordo com o Instituto FNP, no período entre 2003 e 2009 o custo dos defensivos agrícolas teve queda significativa: exceto no manejo químico do algodão, que teve ligeiro aumentou de apenas 3%, todas as demais culturais reduziram, em média expressivos 35%.
Produtos banidos no Exterior e em uso no Brasil
Dependendo das condições agronômicas locais, cada país adota diretrizes próprias sobre registro de produtos. Diferentes climas e tipos de culturas requerem determinados manejos fitossanitários. A comunidade científica e aqueles que atuam nos órgãos regulatórios do governo federal no Brasil (ministérios da Agricultura, do Meio Ambiente e da Saúde), conhecem bem essa realidade na agricultura.
Portanto, cada país, ao retirar do mercado um determinado produto, avalia o impacto no cultivo de alimentos. Por exemplo, se a Europa resolver proibir um defensivo essencial para o feijão, não causará o menor impacto na sua agricultura; porém, será drástica, principalmente para os consumidores, a mesma medida num dos cinco principais países produtores mundiais, segundo a FAO: Brasil, Índia, China, Mianmar e México, que juntos representam mais de 65% da produção mundial.
O processo de reavaliação é previsto no Brasil e nos demais países que possuem uma regulamentação moderna sobre o setor. É totalmente falso alegar a reportagem pressão sobre a área regulatória do Ministério da Saúde. Não há qualquer objeção da indústria sempre que são obedecidos os trâmites da Lei. Em 1993, por exemplo, o Decreto 991 promoveu a reavaliação de todos os produtos registrados.
Posteriormente, 24 produtos tiveram nova reavaliação, com resultado expressivo, com a absoluta maioria sendo aprovada. Apenas cinco foram retirados do mercado, inclusive com a total anuência de seus fabricantes, que já haviam desenvolvido e lançado ingredientes ativos mais modernos. Um dos produtos está em processo de reavaliação, enquanto 18 foram autorizados a continuar sendo normalmente comercializados.
Portanto, quando alguns críticos dos defensivos alardeiam os produtos “banidos no Exterior”, espertamente não contam toda a verdade. Assim, todos 14 os produtos em reavaliação no Brasil, pela Anvisa, continuam sendo produzidos nos principais países agrícolas do mundo: ora nos EUA ou na Europa; ora na Índia ou no Japão e assim por diante. Veja-se, ainda o caso do tão conhecido glifosato: não há restrição de uso ao produto em nada menos do que 130 países.
Cada país, ao retirar do mercado um determinado produto, sabe que haverá impacto insignificante no cultivo de certos alimentos. Por exemplo, se a Europa resolver proibir um defensivo essencial para o mamão, não causará o menor impacto na sua agricultura; porém, será drástica, para os agricultores e consumidores, a mesma medida adotada num dos quatro principais países produtores mundiais, Brasil, México, Nigéria e Índia, que juntos respondem por 75% da produção mundial.
Alimentos seguros e saudáveis
Por fim, resta lamentar que a matéria de Brasil de Fato sequer faz jus ao nome da publicação. Afinal, o Brasil, de fato, responsável pela produção de alimentos que chegam a nossas mesas, não foi ouvido na reportagem: agricultores, especialistas em fitossanidade, médicos toxicologistas e nutricionistas.
Os defensivos agrícolas são resultados da ciência desenvolvida no país, nos laboratórios de universidades, institutos de pesquisa públicos e privados e das empresas. A tecnologia se materializa em produtos aplicados no controle doenças e pragas que, se não combatidas com eficiência, causam gravíssimos prejuízos às plantações.
Para avaliar a segurança do uso das substâncias químicas utilizadas com a finalidade agronômica, inúmeros estudos toxicológicos são requeridos e avaliados pelas agências de regulamentação de cada país, quando da concessão do registro ou na reavaliação dos produtos já registrados (Bases Científicas para Avaliação da Toxidade de Agrotóxicos; ILSI-Brasil, 2010).
O setor apresenta o grau de regulamentação mais rígido do mundo. Até a sua aprovação, os produtos são submetidos a numerosos requerimentos da legislação; sua regulamentação científica inclui comprovações de eficiência e segurança. “Acordos internacionais, tratados e convenções são firmados visando regular e apoiar o manejo responsável de agroquímicos”, destaca Bernhard Johnen, doutor em Agronomia, consultor da FAO, Organização para Agricultura e Alimentação, vinculada à ONU.
No Brasil, antes de serem produzidos, os defensivos agrícolas passam por rigorosa avaliação agronômica, toxicológica e ambiental de três ministérios: Agricultura; Saúde; e Meio Ambiente. Seus técnicos especializados se dedicam, por vários anos, na análise de todos os estudos exigidos para cada produto até ser aprovado. Além da autorização do uso pelos três ministérios, os produtos necessitam de cadastro nos estados.
Pesquisadores sustentam que não há evidências científicas de que, quando usados apropriadamente, os defensivos agrícolas causem efeito à saúde dos agricultores e dos consumidores.
As quantidades residuais em alimentos são insignificantes, tanto que analisadas em PPM, isto é, Partes Por Milhão. “O risco da exposição aos agrotóxicos é muito menor do que o benefício potencial do consumo de frutas e legumes”, garante Eloisa Dutra Caldas, professora do departamento de toxicologia da Universidade de Brasília. São ainda mais eloqüentes as explicações de Ângelo Zanaga Trapé, professor da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp e coordenador da área de saúde ambiental, em entrevista recente à Rádio CBN:
“Não tem que se preocupar porque a quantidade é muito pequena, o resíduo é muito pequeno. Para você ter uma ideia, pegamos um quilo de açúcar e dividimos por mil porções. Cada porção dessa é um grama. Depois, cada porção dessa, dividimos por mil de novo. Dá um miligrama. Depois, dividimos por mil de novo. Dá um micro-
grama. Aí existe um fator de correção de multiplicação por mil que divide esse micro-grama por mais mil. Quer dizer, é como se você pegasse uma pedrinha de areia e colocasse num quilo de pimentão. Essa dose não vai ser capaz de determinar nenhum problema de saúde pública. Tem que tomar cuidado com essas informações porque a Anvisa gera um pânico na população, um problema na cadeia produtiva, os produtores começam a não vender mais os alimentos, sendo que nós estamos com uma segurança muito boa do ponto de vista de saúde pública. A população pode sair despreocupada em comer seu morango à vontade, seu tomate, o ministro pode comer seu pimentão, que é nutritivo, faz bem à saúde e não prejudica do ponto de vista toxicológico nenhum.”
Ou seja, pela presença constante e a forma como é abordado, o tema agrotóxicos está merecendo estudos sobre o papel dos meios de comunicação nas sociedades modernas. O Brasil tem mostrado, em algumas áreas do conhecimento, notáveis avanços: na ciência genética, na pesquisa de combustível fóssil em águas profundas e no desenvolvimento de energias renováveis são áreas em que o país vem ganhando admiração mundial. É tempo de o Jornalismo, que integra a área da Ciência da Informação, experimentar semelhante salto.
*Antonio Carlos Moreira é bacharel em Jornalismo pela Faculdade Cásper Líbero e pós-graduado em Informações Econômico-Financeiras pela Fundação Instituto de Administração, FIA, e gerente de Comunicação da Associação Nacional de Defesa Vegetal, Andef.

Fonte: Portal Rebia 

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